Clube dos Cinco | Uma viagem de volta ao passado

Will you recognize me?

Hoje, falei ao telefone com uma amiga. Em algum momento trabalhamos juntos; mantemos contato e vez por outra nos falamos para colocar as fofocas em dia. Falamos sobre amigos comuns, perspectivas, trabalhos… e no meio da conversa surgiu o Clube dos Cinco. Embora fosse uma conversa ao telefone, não deixei de perceber que seus olhos brilharam com aquele reconhecimento instantâneo que só acontece quando tocamos em uma memória preciosa.

Nossa, quanto tempo não lembro desse filme!

E assim começamos uma conversa que se estendeu por bastante tempo, mergulhando em lembranças e reflexões sobre como um único filme, de 1985, conseguiu capturar tão perfeitamente a essência do que é ser adolescente.

Enquanto conversávamos, percebi que o Clube dos Cinco é como aquele amigo que você não vê há anos, mas quando encontra, parece que o tempo não passou. A história é simples: cinco adolescentes; um sábado de detenção; uma biblioteca. Mas é justamente essa simplicidade que permite que o filme explore questões tão profundas. Como dizia aquela carta final ao Sr. Vernon: “Você nos vê como quer nos ver — nos termos mais simples, nas definições mais convenientes.”

E não é isso que ainda fazemos hoje? Rotulamos as pessoas, encaixotamos personalidades, simplificamos o complexo? O nerd, a princesa, o atleta, a estranha, o criminoso… Quem de nós nunca foi um deles? Ou talvez todos eles, dependendo do dia?

Mais tarde, enquanto tomava uma xícara de café, coloquei Don’t You (Forget About Me) no meu player. A música começa com um golpe seco na caixinha quebrando o silêncio, depois a guitarra faz um ré, um mi, então, Jim Kerr começa: “Hey, hey, hey” e depois “uuuuh, uoooh…” é de arrepiar. Se você viveu nos anos 80, imediatamente viaja no tempo como Marty McFly, para 1985.

É curioso como uma música — que a banda nem queria gravar inicialmente — se tornou não apenas um hino de uma geração, mas um ponto de referência cultural que continua aparecendo em filmes, séries e até desenhos animados. De Bumblebee a Futurama, lá está ela… aquela melodia inconfundível, aquele refrão que todo mundo conhece.

Will you recognize me?
Call my name or walk on by
Rain keeps falling, rain keeps falling
Down, down, down, down

Bumblebee

Futurama

A verdade é que o Clube dos Cinco nunca foi apenas um filme sobre cinco adolescentes presos em uma biblioteca. Foi — e continua sendo — um espelho onde cada geração consegue se enxergar. Os problemas podem ter mudado na superfície (hoje, talvez, eles estivessem todos em seus celulares no início do dia), mas o cerne continua o mesmo: a pressão dos pais, a busca por identidade, o medo de não ser aceito, o desejo de ser compreendido.

Contei para minha amiga como o filme continua influenciando a cultura pop. Falei das referências em séries modernas como Sex Education e Euphoria, das paródias em Community e Bob’s Burgers, e de como cada nova geração de criadores parece encontrar algo relevante naquela história aparentemente simples de 1985.

Mas o mais interessante foi quando começamos a falar sobre como o filme nos afetou pessoalmente. Minha amiga confessou que era “totalmente a Claire” (“A garota de Rosa Shocking” e, quase, “Uma linda mulher”) no colégio, a popular que tinha medo de sair do seu círculo social. Eu ri e admiti que me identificava mais com Brian, sempre preocupado em agradar os pais e aterrorizado com a ideia do fracasso.

É fascinante como um filme pode servir como uma espécie de arqueologia emocional. Cada vez que o revemos, descobrimos algo novo, não porque o filme mudou, mas porque nós mudamos. As cenas permanecem as mesmas, mas nosso entendimento delas se aprofunda com a idade e a experiência.

Quando terminamos nossa conversa, já passava das três da tarde e tínhamos perdido completamente a noção do tempo. Minha amiga decidiu que iria mostrar o filme para o filho, “ele merece essa experiência”, disse ela. “Mas você acha que ele vai entender?”, ela perguntou, preocupada. Respondi que talvez ele não entenda tudo na primeira vez — nós também não entendemos. Mas é isso que torna o Clube dos Cinco especial: ele cresce com você.

Ao final do dia, pensei em como é raro uma obra de arte conseguir esse tipo de permanência. Não é apenas nostalgia — embora ela esteja lá, nos penteados, nas roupas, na música, em cada quadro do filme. É algo mais profundo: a capacidade de falar verdades universais através de uma história específica.

E enquanto saía de casa para ir à padaria, peguei-me erguendo o punho, imitando aquele gesto final de Bender. Porque, no fundo, todos nós ainda somos um pouco cérebro, atleta, maluco, princesa e criminoso. Só precisamos de um sábado de detenção de vez em quando para nos lembrar disso.

Bilhete deixado ao sr. Vernon

“Dear Mr. Vernon,

We accept the fact that we had to sacrifice a whole Saturday in detention for whatever it was we did wrong. But we think you’re crazy to make us write an essay telling you who we think we are. You see us as you want to see us — in the simplest terms, in the most convenient definitions. But what we found out is that each one of us is a brain… and an athlete… and a basket case… a princess… and a criminal.

Does that answer your question?

Sincerely yours,
The Breakfast Club”

“Caro Sr. Vernon,

Aceitamos o fato de que tivemos que sacrificar um sábado inteiro em detenção pelo que quer que tenhamos feito de errado. Mas achamos que você é louco por nos fazer escrever uma redação dizendo quem pensamos que somos. Você nos vê como quer nos ver – nos termos mais simples, nas definições mais convenientes. Mas o que descobrimos é que cada um de nós é um cérebro… e um atleta… e uma maluca… uma princesa… e um criminoso.

Isso responde à sua pergunta?

Atenciosamente,
Clube dos Cinco”

O bilhete é um resumo do filme porque:

1. Representa a transformação que ocorreu durante aquele sábado;
2. Desafia diretamente a autoridade e a visão simplista do Sr. Vernon;
3. Mostra como eles superaram os estereótipos iniciais;
4. Simboliza a união que desenvolveram.

Renato Ipiranga
Engenheiro de Software e pretenso escritor.

2 COMENTÁRIOS

  1. É fato de quem viveu a década de 80.
    Tive a honra de ter vivido e ainda trago recordações de uma época sem comparação. Posso dizer que fomos felizes.

  2. Que texto incrível! Fui arrebatada até os anos 80 – década pela qual sou apaixonada mesmo sem tê-la vivido, pois cresci com as músicas, filmes, séries e as histórias que a minha mãe me contava sobre a adolescência dela. E é incrível como os filmes do John Hughes me levam até esse lugar, esse sentimento de ter saudades de algo que nem vivi, mas sinto como se tivesse através da ótica dele.

    Clube dos Cinco reflete exatamente isso pra mim: essa nostalgia gostosa, seja na batida da canção do Simple Minds no início do filme (após o toque do sinal), seja na cena final quando Judd Nelson ergue o punho… esse é o sentimento. Obrigada por refleti-lo no texto. ✊🏼😎

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